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quarta-feira, 24 de julho de 2019

Teodora, Justiniano e a reencarnação.



Circula faz tempo em livros espíritas e espiritualistas e na internet essa informação e devo informar que ela é incorreta.

 A questão sobre  Teodora  é duvidosa, carece de fontes. Ela é reproduzida faz tempo, mas vejo como mais um jeito de culpar a mulher sobre as coisas.

Já vi isso ser dito até em filmes americanos. Oradores famosos, livros, etc...
Mas nunca vi ninguém  pesquisar as fontes históricas que existem, de fato, sobre Teodora.

Entendamos que a Igreja Católica, como conhecemos não existia ainda. Estava começando a se desenhar nos séculos VI e VII.

O que tínhamos até esse momento eram os bispos, líderes locais. Cada região ou cidade tinha o seu.

 A Igreja Católica estava surgindo por essa época e ela surge, mais ou menos com a cara que temos hoje, como um bastião de resistência da cultura romana, incorporando em seu interior muitas práticas do império em decadência.

O cristianismo a partir do segundo século é tomado pelos intelectuais. Esses teólogos dão a cara do cristianismo, segundo suas ideias e entendimentos. Ali, neste momento, as ideias ligadas à reencarnação desaparecem. Os teólogos, muitos deles por essa época morreram mártires nos circos. Entendiam a que a fonte da redenção  era morrer para ressurgir no mundo espiritual. A ressurreição  era o centro da fé. A própria ideia de ressurgir em espírito no "céu" , foi se perdendo para a ideia de ressureição  em corpo físico.

O que aconteceu nesse concílio é que ficou de uma vez por todas proibido como um dogma de fé a ideia de que a alma já existia antes de nascer.
Isso por que muitos intelectuais cristãos renomados defendiam esta ideia, não exatamente a reencarnação.

A ideia da reencarnação existia entre alguns  cristãos por essa época, mas poucos, e muito vagamente. Antes, nos inícios do cristianismo do primeiro século, quando os cristãos eram também judeus, podemos dizer que havia sim a crença na reencarnação, por que os judeus tinham  a reencarnação como uma possibilidade, e ainda tem.
  Mas após a dispersão do povo judaico e a independência do cristianismo do judaísmo, feita por Paulo de Tarso, nós começamos a ter, já no II século e III século, intelectuais cristãos que começam a descartar essas  idéias, tidas como não fundamentais e mesmo como interferências expúrias do vero cristianismo. Pois a pedra fundamental começa a ser a ressurreição no sentido de ir em corpo físico para o céu. E Jesus como Deus. ( lógico havia muita discordância sobre isso entre os intelectuais cristaos, mas no final os que acreditavam nisso ganharam mais espaço e impuseram suas idéias)

 E, quando o cristianismo no século IV começa a ter espaço ele busca, pouco a pouco, descartar a reencarnação de seus postulados, isso por que no império romano circulavam várias crenças reencarnacionistas, como os gnósticos, cristãos ou não, os judeus,  os neoplatônicos, os pitagóricos, etc...

 Alguns cristãos mantinham a reencarnação, no conjunto de suas crenças, mas nesses poucos ela
não era algo importante ou crucial na fé deles, nem algo escrito, pois os cristianismos espalhados tinham uma variedade imensa de crenças e nuances.
E nessa época escrever as crenças  eram fundamentais para que as mesmas se perpetuassem. Por isso afirmamos que os letrados teólogos desde o século II delinearam o caminho teológico que  o cristianismo seguiria, pelo simples fato de que eles eram letrados, intelectuais e capazes de influenciar as mais importantes comunidades cristãs da época, aquelas que tinham maior número de adeptos e que liam seus escritos.

Precisamos lembrar que os escritos eram feitos à mão, eram pouquíssimos,  como eram poucos aqueles que sabiam ler e escrever.
Um texto só era reproduzido se houvesse interesse nele.  Portanto os diversos cristianismos que haviam, com suas diversas nuanças foram se extinguindo na medida que os líderes dos grandes centros foram disseminando sua rede de saberes para outros grupos e demonizando toda ou qualquer vertente que tivesse contato com crenças  tradicionais judias, hindus platônicas,  mistéricas, órficas, pitagóricas, caldéias, etc,  conhecidas em sua grande maioria com o título de gnósticas.


 Os concílios surgiram justamente para uniformizar a fé e não permitir idéias diferentes. Com o surgimento de uma proposta de uma só Igreja Universal, ou seja, única, católico quer dizer universal, buscou-se uniformizar a fé, impondo-a num formato único e excludente. Na verdade, com o crescimento do cristianismo, nos seus inícios  haviam muitas vertentes, pregando muitas coisas diferentes.

 A ideia da alma existir antes de nascer, realmente dava a possibilidade de se acreditar também na reencarnação, mas a reencarnação nunca foi uma crença fundamental no cristianismo. E ela não foi debatida nesse concílio. E no catolicismo , ( ou seja, o domínio ou ascendência do bispo de Roma sobre outros bispados)
que surge, com o domínio e interferência dos imperadores sobre os destinos da fé e o lento e incessante destaque do bispo de Roma sobre os demais, nunca teve nela um objeto central de sua crença.

Os bispados se tornam um braço  dos imperadores que intervém  diretamente nos concílios. Este concílio, de fato, teve total interferência de Justiniano. Tendo uma série de resoluções  teológicas que iam de encontro aos interesses políticos expansionistas de Justiniano que pretendia recriar o antigo império romano.

A ideia de reencarnação  portanto, não era predominante na época de Justiniano no cristianismo. A ideia predominante nesta época, séculos 5 e 6, é de que Jesus era Deus, que tinha ressuscitado em carne e osso, que a pneuma,  fala dos Espíritos,  era a fala de um só espírito, o espírito santo, que era uma variação ou atributo de Deus. A divina Trindade  ( paradoxalmente, essa ideia também  tirada das crenças  religiosas não cristãs, notadamente do platonismo que bebeu dos pitagóricos, dos egípcios e de tantas outras crenças politeístas que acreditavam numa tríade divina)

A ideia de reencarnação  se perdeu a partir do momento em que o cristianismo se aparta do judaísmo, colocando a figura de Jesus como o centro da salvação.

Aí abre -se espaço para o ritual como sendo o caminho da salvação,  o ritual sendo praticado por uma autoridade, o sacerdote, pastor, bispo, que seria aquele que teria o poder,  através  do batismo, de ligar a pessoa à Cristo.
Portanto a deformação das ideias espirituais dentro do cristianismo foi paulatina, crescente, inevitável, podemos dizer .

Era e é natural que diante de um povo ainda muito primitivo e rude, ideias avançadas se percam,  se diluam, se deformem, não por má fé das pessoas. Elas não ignoraram e depois execraram a reencarnação  por que eram más  pessoas, mas por causa da absoluta incapacidade de entendê-las  e encaixá-las dentro de um sistema de crença, que já era aquela altura, salvacionista e que colocou uma pessoa como o centro da salvação.

Então, diante disso,  devemos dizer que esta informação  sobre Teodora ser a causadora, influenciando Justiniano, até que se provem o contrário com documentos, é inverídica,
Devemos como educadores falar e pregar a partir de fatos e não repetir informações  falsas por assim ouviu dizer.

Um comentário:

Unknown disse...

Muito esclarecedor