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segunda-feira, 30 de maio de 2011

Reencarnação: apologia espírita ou ampliação de possibilidades discursivas?


Não sei se a intenção real do texto passou despercebida, até por que, esse texto foi improvisado e sem nenhuma pretensão, surgiu como conversa de email, com pessoa não reencarnacionista, de uma lista de grupo na internet, mas, a questão que quis salientar, não era exatamente, a apologia espírita, mas o fato simples e corriqueiro de que os judeus tinham a reencarnação como crença comum.

A velha tendência totalizante de universalizar uma lógica europeia ou ocidental.
Os métodos de pesquisa ao partirem de um suposto metodológico eficaz, traduzem em seu bojo as reticências ao “irracional” ou seja, a tudo que, por não ser espelho, deve ser tratado de forma a ser minimizado, colocado no campo da apologia ou mesmo ridicularizado.


Se a afirmação sobre a crença reencarnacionista dos judeus do século de Jesus soar absurda e/ou ridícula, isso ocorre porque estamos condicionados ao “modo de ser” que logica com as bases do ceticismo branco-ocidental. Que trata os critérios e supostos cristãos da Igreja e do cristianismo teológico medieval como os supostos permitidos para toda ou qualquer análise sobre o cristianismo, seja com que abordagem pesquisística for.

É assim que não nos incomoda afirmar, seja para analisar, refutar, negar ou o que for sobre Jesus como: se ele era mulato ou não, se ele era filho bastardo ou não, se ele existiu ou não, se ele na verdade viveu 100 anos antes do que dizem ou não, se ele tinha um discurso alinhado com a teologia da libertação ou não, se ele casou com Madalena o não, etc... Todos discursos quer sejam para analisar, sejam para criticar, sejam para polemizar partem de um suposto: dialogam com a tradição cristã tal qual chegou até nós. Via teologia, concílios e construções discursivas milenares.

Evitam, ignoram ou deixam de lado as crenças judaicas que não se encaixem com o formato ocidental de ver as coisas. Ignorando que essas crenças faziam parte do cotidiano do Cristo, que era judeu e conviveu com judeus.

A grande questão, é que a academia subsumi, um a priori ocidental e cristão que descarta outras possibilidades, como a crença reencarnacionista e cria ou recria um judaísmo ocidentalizado, essa reorganização de saberes por vezes é tão avassaladora e condicionante que atinge, mesmo acadêmicos e judeus.
Mas, nos estudos e conversas que pude ter com judeus que conhecem a tradição judaica, fica claro que o judaísmo não aceita a catolicização, a luteranização e/ou a calvinização do velho testamento feita no ocidente da sua cultura e da sua tradição. Esta cristianização ou ocidentalização e que de certa forma, é a base de onde parte os pesquisadores, tornando-se, ainda que involuntário, um a priori acadêmico. Até por que os estudos relacionados ao cristianismo partem em geral, ou de pessoas que pertencem inteiramente ao horizonte mental católico e ou protestante e dali partem a fazer suas pesquisas seja para confrontar essas mesmas instituições, seja para aprofundar suas compreensões sobre o mesmo. Ou de pessoas que partindo de uma visão materialista, tem essa visão em confronto com as ideias cristãs tradicionais, importando, por isso mesmo, certos pressupostos básicos para efetuarem seus confrontos.
Que em geral é estudado por pessoas ligadas culturalmente ao catolicismo e ao protestantismo.
Ao se debruçar sobre o texto, o pesquisador é incapaz de enxergar coisas que são, (não porque eu, espírita, e reencarnacionista, quis que fossem assim, esse é o X da questão.)
È que esse povo assim acreditava. - E isso, é claro, não foi exceção nos tempos em que se diz que Jesus andou por aqui – Que o povo judeu tinha a ideia reencarnacionista em sua “mentalidade”. Dentro de uma perspectiva de Longa duração, que continuou até os dias de hoje. Perspectiva que eram e são corriqueiras de um povo, no caso, os judeus e a ideia do voltar de novo ao físico. Em novo corpo.
Os pesquisadores acadêmicos que estudam o cristianismo se por um lado podem ser ousados em questões de comportamento e crítica social – feminismo, violência, homofobia, machismo, intolerância, etc..
Relacionado às suas próprias questões, o pesquisador não parte de um nada, ele levanta questões ligadas de alguma forma a sua vida.
É assim que em geral quem estuda questões ligadas a homofobia no passado são homossexuais e quem estuda questões do feminino são mulheres e homossexuais. Nada demais. Até por que não raro as pesquisas levam por caminhos inesperados.

Mas, as bases ocidentais, em geral, sejam marxistas, antropológicas ou foucaultianas, etc, são arredias ao, chamado “irracionalismo”, o mágico, o espiritual, o transpessoal, o reencarnacionista, descartando tais percepções, sempre que surgem, com o argumento de que são: ou irrelevantes, ou exceção, ou caso único, ora como desvio....ou como , no caso do Brasil, apologia de espírita.

Não se trata tão pouco de espiritizar o judaísmo. Em todos os estudos sobre tradições antigas que advogavam ideias reencarnacionistas, sabemos de antemão que essas ideias terão “sabores” próprios adstritos a cada cultura e a cada momento. Tendo formas, razões e motivos que não coincidem com a visão evolucionista espírita. Mas, que, apesar disso, das diferenças e prioridades que cada cultura dá a esse tema. A ideia, em si, do voltar a nascer na Terra, com novo corpo, existia, era uma possibilidade. Com nuanças próprias de cada povo ou região. Mas era uma possibilidade em aberto. Uma possibilidade que amplia as nossas construções discursivas de sentido.

São incapazes de enxergar, por que como tal hipótese nunca passou por sua formação cultural, ela é inexistente, ela é não enxergada, e qualquer tentativa de citá-la é vista como exotismo de esotéricos.
Descartam devido a um a priori avassalador de 1800 anos de teologia escolástica que atingiu o ocidente. Isso atinge, inclusive os pesquisadores acadêmicos ateus ou agnósticos. Portanto, incapazes de enxergar, por mais que façam a crítica dos textos, possibilidades que não estão assumidas na sua cultura ocidental.

( Esse tema, inclusive tem a ver com as minhas pesquisas nos tempos de academia que resultaram na minha monografia: a distorção do olhar do pesquisador que ao ler a história antiga, com olhos europeus ocidentais, vê como ridículo ou simplesmente não vê, coisas que o povo antigo investigado por ele tinha, pressupostos, embasamentos e horizontes de percepção diferentes do seu.)

O que quis e quero dizer no texto não é bem uma: “apologia cristã para espíritas”, mas sim que:
Os judeus acreditavam na reencarnação. E que isso amplia nossos horizontes pesquisisticos para uma gama de possibilidades de construção de sentidos e percepções do cotidiano do homem antigo.


em "um mundo no qual nada de importante se faz sem discurso" (Milton Santos, Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal.)
Ampliar as possibilidades de discursos rompendo, sem pusilanimidades, com a forte pressão condicionante teológica que cercam os estudos sobre cristianismo antigo.

Não há nenhum motivo, portanto, dentro de uma visão acadêmica honesta e isenta, para descartar essa percepção de mundo que eles tinham de textos judeus, seja quais forem, apenas por que a tradição cristã ocidental descartou a hipótese reencarnacionista de suas crenças. Ou de suas construções de possibilidades.

Os textos testamentários escritos por judeus não têm por que fugir dessa abordagem.
Bem, como a gente pode ver, o estudo da história antiga é fascinante, e ainda "dá panos pra manga" por que o homem antigo nos revela um homem para além dos condicionamentos culturais que se iniciam na idade média e que vigoram no horizonte cultural do mundo "civilizado" atual.

Anderson.

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