AUTO-PERDÃO
"Perdoar aos inimigos é pedir
perdão para si mesmo...”.
““... Porque se sois duros, exigentes,
inflexíveis, se tendes rigor mesmo por uma ofensa leve, como quereis que Deus
esqueça que, cada dia, tendes maior necessidade de indulgência?
(Cap. X, item 15)
Nossas reações frente à vida não
acontecem em função dos estímulos ou dos acontecimentos exteriores, mas sim em
função de como percebemos e julgamos interiormente esses mesmos estímulos e
acontecimentos. Em verdade, captamos a realidade dos fatos com nossas mais
íntimas percepções, desencadeando consequentemente peculiares emoções, que
serão as bases de nossas condutas e reações comportamentais no futuro.
Portanto, nossa forma de avaliar e
reagir frente anos nossos atos e atitudes frente aos outros, conceituando-os
como bons ou maus, é determinada por um sistema de autocensura que se encontra
estruturado nos "níveis de consciência" da criatura humana.
Toda e qualquer postura que assumimos na
vida se prende á maneira como olhamos o mundo fora e dentro de nós, podendo nos
levar a uma sensação íntima de realização ou de frustração, de contentamento ou
de culpa, de perdão ou de punição, de acordo com nosso "código moral"
modelado na intimidade de nosso psiquismo.
Nosso "julgador interno" foi
formado sobre as bases de nossos conceitos acumulados nos tempos passados das
vidas incontáveis, como também com os pais atuais, com os ensinamentos de
professores, com líderes religiosos, com o médico da família, com as
autoridades políticas de expressão, com a sociedade enfim.
Também, de forma sutil e quase
inconsciente, no contato com informações, ordens, histórias, superstições,
preconceitos e tradições assimilados dos adultos com quem convivemos em longos
períodos de nossa vida. Portanto, ele, o julgador interno, nem sempre condiz
com a realidade perfeita das coisas.
Essa "consciência crítica" que
julga e cataloga nossos feitos, auto censurando ou auto-aprovando, influencia a
criatura a agir da mesma maneira que os adultos agiram sobre ela quando
criança, punindo-a, quando não se comportava da maneira como aprendeu ser justa
e correta, ou dando toda uma sensação de aprovação e reconforto, quando ela
agia dentro das propostas que assimilou como sendo certas e decentes.
A gênese do não-perdão a si mesmo está
baseada no tipo de informações e mensagens que acumulamos através das diversas
fases de evolução de nossa existência de almas imortais.
Podemos experimentar culpa e condenação,
perdão e liberdade de acordo com os nossos valores, crenças, normas e regras
vigentes, podendo variar de indivíduo para indivíduo, conforme seu país, sexos,
raça, classe social, formação familiar e fé religiosa.
Entendemos assim que, para atingir o
autoperdão, é necessário que a criatura reexamine suas crenças profundas, sob a
natureza do seu próprio ser, estudando as leis da Vida Maior, bem como as
raízes de sua educação da infância atual.
Uma das grandes fontes de auto-agressão
vem da busca apressada de uma perfeição absoluta, como se todos devêssemos ser
deuses ou deusas de um momento para outro. Aliás, a exigência de perfeição é
considerada a pior inimiga da criatura, pois a leva a uma constante hostilidade
contra si mesma, exigindo-lhe capacidades e habilidades ainda não adquiridas
por ela.
Se padrões muito severos de censura
foram estabelecidos por pais perfeccionistas à criança, ou se lhe foi imposto
um senso de justiça implacável, entre regulamentos disciplinadores e rígidos,
provavelmente ela se tornará um adulto inflexível e irredutível para com os
outros e consigo mesmo.
Quando sempre esperamos perfeição em
tudo e confrontamos o lado "inadequado" de nossa natureza humana,
sentir-nos-emos fatalmente diminuídos e envolvidos por uma aura de fracasso.
Não tomar consciência de nossas limitações é como se admitíssemos que os outros
e nós mesmos devêssemos ser oniscientes e todo-poderosos. Afirmam as criaturas:
"Recrimino por ter sido tão ingênuo naquela situação..." "Tenho
raiva de mim mesmo por ter aceitado tão facilmente aquelas mentiras...";
"Deveria ter previsto estes problemas atuais"; "Não consigo
perdoar-me, pois pensei que ele mudaria...".
São maneiras de expressarmos nossa culpa
e o não-perdão a nós mesmos – exigências desmedidas atribuídas a pessoas
perfeccionistas.
Os viciados em perfeição acham que podem
fazer tudo sempre melhor e, portanto, rejeitam quase tudo o que os outros fazem
ou fizeram. Não aceitam suas limitações e não enxergam a "perfeição em
potencial", que existe dentro deles mesmos, perdendo assim a oportunidade
de crescimento pessoal e de desenvolvimento natural, gradativo e constante, que
é a técnica das leis do universo.
A desestima a nós próprios nasce quando
nós não nos aceitamos como somos. Somente a auto-aceitação leva a criatura a
sentir uma plena segurança frente aos fatos e às ocorrências do seu cotidiano,
ainda que os indivíduos a seu redor não a aceitem e nem entendam suas melhores
intenções.
O perdão concede a paz de espírito, mas
essa concessão nos escapará da alma se estivermos presos ao desejo de dirigir
os passos de alguém, não aceitando o seu propósito de viver.
Deveremos compreender que cada um de nós
está cumprindo um destino só seu, e que as atividades e modos das outras
pessoas ajustam-se somente a elas mesmas. Estabelecer padrões de comportamento
e modelos idealizados para os nossos semelhantes é puro desrespeito e
incompreensão frente ao mecanismo da evolução espiritual. Admitir e aceitar os
outros como eles são nos permite que eles nos admitam e nos aceitem como somos.
Perdoar-nos resulta no amor a nós mesmos
- o pré-requisito para alcançarmos a plenitude do "bem-viver".
Perdoar-nos é não importar-nos com o que
fomos, pois a renovação está no instante presente e o que importa é como somos
agora e quais são as determinações atuais para o nosso progresso espiritual. Perdoar-nos
é conviver com a mais nítida realidade, não se distraindo com as ilusões de que
os outros e nós mesmos "deveríamos ser" algo que imaginamos ou
fantasiamos.
Perdoar-nos é compreender que os que nos
cercam são reflexos de nós mesmos, criações nossas que materializamos com
nossos pensamentos e convicções íntimas. O texto em estudo - "perdoar aos
inimigos é pedir perdão a si mesmo" - quer dizer: enquanto nós não nos libertarmos
da necessidade de castigar e punir ao próximo, não estaremos recebendo a dádiva
da compreensão para o autoperdão.
"... porque se sois duros,
exigentes, inflexíveis, se tendes rigor mesmo por uma ofensa leve...",
como haveremos de criar oportunidades novas para que o "Divino Processo da
Vida" nos fecunde a alma com a plenitude do Amor a fim de que possamos
perdoar- nos?
Hammed.
Nenhum comentário:
Postar um comentário