Matéria extraída do Editorial do jornal Correio Fraterno do ABC (Editorial)
Março de 1993
O debate tomou rumo indesejável quando o ouvinte contestou o expositor, alegando que o discurso dele não diferia em nada dos feitos pelos clérigos conservadores. Moralista, castrador, punitivo, discriminatório e, acima de tudo, com vazo de censura.
De fato, toda campanha provida é absolutamente necessária e meritória. As resistências ao aborto, à pena de morte, à depredação do Planeta são sempre merecedoras de respeito e credoras de nossa reflexões. Querer impô-las, entretanto, é desrespeitar o livre arbítrio alheio. Há que se considerar que a melhor forma de se combater a ignorância é espalhar o saber. Fora disso é tolice.
O ser iluminado pelo conhecimento não se guia pelas leis apenas, mas, sobretudo, pela ética consciencial. Quando ele chega a esse estágio, as proibições lhe são inúteis, porque sabe agir com responsabilidade em quaisquer circunstâncias. Tem a liberdade como um bem que deve ser preservado pelo discernimento do certo e do errado, bem como pelo respeito de si e do próximo.
As religiões falham no seu papel quando domina os seus adeptos pelo medo do pecado. O homem precisa saber e não temer. Algumas delas, aproveitando-se de sua influência política, chegaram mesmo a inspirar leis civis que aplacassem a ira de Deus. Estratégia infeliz, inverosímil e inaceitável por todos, o tempo todo. Ira, pois, é sentimento humano e não divino. Descoberta essa farsa, eis o pecador livre da marota feia. Deseducado, continua então a cometer os mesmos erros. É por isso que o Ser Supremo, através de seus Mensageiros, não proíbe, esclarece.
O Estado também claudica quando impõe restrições aos seus cidadãos. Melhor será que os eduque.
O Espiritismo, consciente de sua tarefa, não impõe, não proíbe, explica.
Coerente com essa postura, o divulgador espírita deve analisar, debater os problemas e, buscando as melhores soluções, relacioná-los com postulados doutrinários, sem, contudo, pintar um clima de censura inquisitorial indigno do Espiritismo. Este não busca aprisionar ninguém pela ignorância, mas enseja a liberdade espiritual pelo conhecimento da verdade, conforme sugeriu Jesus.
Tolher o homem por decreto ou por dogmas religiosos é querer permanecer convivendo com a hipocrisia. No Brasil, por exemplo, país essencialmente religioso, o aborto é crime previsto em lei e abominado pelas religiões. E todo mundo sabe que aqui se pratica esse delito milhões de vezes por ano.
Por esse abuso à legalidade e aos preconceitos religiosos? Porque as pessoas não foram ainda suficientemente informadas e convencidas de que se podem burlar as leis terrenas e esconder seus pecados de suas Igrejas, jamais fugirão das leis divinas.
Desenvolva-se no homem a capacidade de amar e o aborto e as demais mazelas que rolam por esse mundo desaparecerão.
Voltem-se as baterias à destruição do egocentrismo e tudo será equacionado dentro dos parâmetros viáveis e civilizados por cada criatura.
Cada problema tem sua causa-núcleo. Atacá-lo pela periferia, sem atingir-lhe a origem é desperdiçar munição.
Recorra-se, não às opressões, (como se fez no passado e como alguns teimam em fazer ainda hoje), mas às sinceras elucidações e à humildade para levar o esclarecimento mais apropriado aos que buscam novos rumos e dentro em breve veremos florescer uma nova humanidade na Terra.
Revolucionem-se os nossos meios de comunicação, imprimindo-lhes a força da persuasão democrática, pela linguagem objectiva, sadia, sem ranço de personalismo moralista, autoritário, vaidoso, mas, sim, fortalecida pelo equilíbrio de quem fala, e o homem mudará logo seu tonus vibratório e, consequentemente, seu procedimento.
Que não se combata a treva, simplesmente. Ilumine-a. Que não se limite a falar do mal. Construa o bem.
Se a boa semente for bem cultivada, desabrochará e crescerá de tal forma que o joio não terá condições de sufocá-la. Todo esforço deve ser empregado na manutenção e no desenvolvimento da boa sementeira. A má já basta por si só. Dar-lhe trela e espaço certamente significará o atrofiamento daquela. Enfim, semear o bem é uma questão de inteligência.
Concorda?
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